segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

idiomas, pra que vos quero

Então este ano parece que eu vou mesmo estudar árabe. Árabe! As pessoas me olham encafifadas: afinal, para que estudar árabe? Estuda-se inglês, em geral, para "se comunicar com todo mundo", dizem por aí que é a tal "língua global". Estuda-se espanhol, em geral, para "se comunicar no mercado de trabalho com o mercosul". Alguns estudam francês por puro capricho, outros por necessidades de trabalho e acadêmicas. Mas e o árabe?

Ao contrário do que pode parecer pensando no senso comum, falando apenas inglês como segunda língua não somos capazes de nos comunicar com quase ninguém. Na verdade, somos capazes de nos comunicar em vários países, mas apenas com a pequena parcela de suas populações que foram educadas com o inglês como língua estrangeira (em alguns também como língua oficial). Bastou minha primeira saída do país, em 2005, para a Tunísia, para desmantelar esse conto. Foi mais fácil achar tunisianos que falassem espanhol, na época, do que inglês. Alguns anos depois, na Inglaterra, fiz amizade com um grupo de italianos que praticamente não falava (ou falava muito pouco) inglês. No ano seguinte a isto, na Coréia do Sul, idem: os coreanos mais jovens compreendiam o que eu falava, mas muitos não sabiam falar. Vejam só.

Aprender um idioma não é apenas uma questão de conhecimento do idioma e de uma certa cultura a ele associada. É uma questão muito mais ampla de acesso a todo um conhecimento produzido excluisvamente naquele idioma. Vejam bem; minha amiga que estuda teoria crítica não pode se furtar a aprender o alemão. Não tem nada a ver com o fato de traduções 'perderem' ou não sentidos originais, mas com o fato de que muita coisa simplesmente não foi traduzida, ou então as traduções são proprietárias e os originais já não têm direitos autorais (em alguns casos). É assim com o inglês.

Percebo, no cotidiano acadêmico, a diferença que faz o domínio de idiomas estrangeiros para a própria qualidade e amplitude da pesquisa bibliográfica que embasa projetos de pesquisa, artigos, etc. Com acesso apenas ao que foi publicado em português, limita-se diálogo e alcance das conclusões de pesquisa, e às vezes limita-se acesso a dados também. Sem falar na produção de excelentes artigos, em especial no caso dos periódicos especializados em inglês ou francês (cito estes porque são os que melhor conheço), que jamais serão traduzidos salvo raríssimas exceções.

Sabendo inglês, francês e espanhol com certa fluência;
considerando que não estudo nenhum país de língua árabe ou cultura predominantemente árabe;
considerando que a produção em árabe pra minha área de estudos não é über-relevante;
então, por que raios desejo aprender árabe?

Aí é que está. Dominando inglês, francês e espanhol, cubro as necessidades práticas da minha carreira. Quase todas, até onde tenho percebido. Me dou ao luxo, então, de escolher acessar um outro tipo de conhecimento e informação, que talvez nem seja diretamente útil para meu trabalho: a cultura e a política. Quero aprender árabe para ler literatura árabe sem depender do crivo mercadológico ocidental das editoras que os publicam em inglês, espanhol, francês e português. Quero aprender árabe para ter acesso a filmes para os quais nunca foram feitas legendas. Para obter informações diretas de países árabes sobre sua própria situação política, econômica, social, sem a edição dos jornalhões e agências de notícias 'internacionais' ou 'globais' (que na prática são dois nomes para 'ocidentais'/'euroamericanas'/etc).

Pelo mesmo motivo, a língua que se segue ao árabe em minha lista de desejos é o chinês/mandarim. Depois dela, o russo, ou o swahili. Isto cobre, creio, grande parte dos países em que há conhecimentos específicos, pontos de vista, elementos culturais absolutamente ignorados pelo olhar dos editores 'ocidentais' ou 'internacionais'.


Vou estudar árabe porque eu quero saber por mim mesma.
Saber o quê?
Tudo. Ou o máximo possível.

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